Na semana passada eu resolvi quebrar alguns paradigmas e viajei para a Argentina. Eu nunca tive vontade de visitar los hermanos, ou o mínimo interesse na literatura em espanhol. Confesso que voltei de lá muito surpresa com o que vi e convencida que, mesmo a pessoa mais convencida do mundo (eu) pode estar completamente enganada. É isso mesmo gente, Buenos Aires é divina. Eu fui bem tratada, achei a cidade charmosíssima, curti demais enrolar no espanhol e definitivamente eu ainda volto lá.

Falando do que mais importa, que são os bichos, logo no primeiro dia eu encontrei diversos passeadores de cachorros. São pessoas que andam com os cães, sendo cinco, dez e até vinte de uma só vez. Como era de se esperar, não vi nenhum passeador de gatos e pensei: Qual será a freqüência na criação dos bichanos aqui?

Eu estou acostumada com o Brasil aonde temos uma clínica veterninária ou ao menos um petshop por esquina, e estranhei não ver o mesmo em Buenos Aires. Devo ter visto uns dois petshops de pequeno porte no centro da cidade. Claro que já sei com o que vou trabalhar quando me mudar para Buenos Aires, ehehe. Com relação à cultura, esta é riquíssima e foi por mim muito apreciada. Já considerando os livros e textos técnicos em espanhol, não existe mais a barreira da linguagem (que era muito mais por preconceito do que por dificuldade), o que já me fez pesquisar bastante.

E os gatos?

Perguntei a umas duas pessoas se os bichanos eram muito criados por lá, mas não souberam me responder. Quando eu já estava perdendo as esperanças eu os encontrei. Esse grupo que encontrei vive em bandos, no Cemitério da Recoleta. Esse cemitério é lindo na sua arquitetura e ver aquela beleza de lugar povoada por gatos enormes e peludos foi fantástico.

Os turistas paravam para tirar fotos e “carinhar” os fofos. Durante essa visita, eu pude perceber que um dos gatos apresentava uma lesão no plano nasal. Eu fiz carinho, fotografei e é dessa lesão que eu quero falar aqui.

A lesão no plano nasal em felinos pode ter algumas causas como esporotricose, criptococose e carcinoma de células escamosas, sendo este último o nosso assunto de hoje.

O carcinoma de células escamosas (CCE),  também conhecido como Carcinoma espinocelular e Carcinoma Epidermóide, é uma neoplasia maligna que pode acometer os gatos, sendo a quinta neoplasia de maior freqüência nessa espécie.

Essa neoplasia envolve a pele, conta como 15% daqueles tumores de pele nos gatos, o seu aparecimento pode estar relacionado com a exposição solar e acomete animais com uma média de 12 anos.  O CCE é encontrado em áreas despigmentadas ou com pouca pigmentação e com pouca cobertura de pêlos, como plano nasal, pálpebras e pavilhão auricular. Cerca de 30% dos gatos com CCE apresentam multi-lesões faciais.

As lesões mais comuns são as erosivas. Geralmente começam com uma ferida superficial, que sangra facilmente, crostrosa e que pode desenvolver para uma úlcera profunda. Essas neoplasias são bastante invasivas localmente e podem fazer metástase, isto é, se espalharem para outros órgãos sendo as vias mais comuns a sanguínea e a linfática.

O diagnóstico deve ser feito com o conjunto de dados obtidos no exame físico, aparência e comportamento da lesão, citologia e biópsia.

O tratamento vai variar de acordo com o grau de acometimento mas geralmente é cirúrgico. A depender do tamanho da lesão, pode-se realizar a criocirurgia (com gelo) com sucesso. Já foi relatado tratamento com radioterapia e terapia fotodinâmica. O uso da quimioterapia tem demonstrado pouca eficácia.

O prognóstico vai depender da localização, do tamanho e tempo de aparecimento da lesão. Lesões localizadas, em local de fácil cirurgia com uma boa margem (isto é, retirando-se o tecido que circunda a lesão para ter mais segurança) vão apresentar melhor prognóstico do que aquelas que estão em locais de difícil acesso. É mais fácil tratar de uma lesão no pavilhão auricular com a cirurgia, amputação ou criocirurgia, do que retirar a lesão do plano nasal, por exemplo.

Como a etiologia (causa) dessa neoplasia pode estar relacionada com a incidência de radiação solar, uma atenção especial deve ser dada nas áreas de rarefação pilosa (pouco pêlo) e a animais de pêlos brancos. O aparecimento de qualquer lesão deve ser informado ao veterinário, e o uso de protetor solar é recomendado.

É isso aí, gente, cuidado nunca é demais com os bichanos e, se você tiver a oportunidade, aproveite uma promoção, vá para Buenos Aires enquanto o câmbio está a favor e aproveite o friozinho, as carnes, os vinhos, a cultura e a beleza.

Até mais

Alice Albuquerque
diarioveterinaria.blogspot.com
twitter @alicevet

Bibliografia consultada:
Small Animal Clinical Oncology – Withrow e MacEwen
Leitura recomendada:

Fonte das imagens: Acervo pessoal de Dra Alice Albuquerque



3 comentarios:

Zanarde disse...

Que legal essa matéria, que bom que vc gostou de BA. Já ouvi falar que é bonita mesmo. E os bichanos são lindos em todos os lugares...
é bom saber dessa doença, a minha bebe ta quase com 12 anos...
bjs, parabens

João Víctor disse...

Nunca fui a BA, mas a cidade parece ter pouco espaço físico para *qualquer* animal, e os gatos acabaram ficando de fora (que contradição...). Minha gata tem quase três anos, mas vou ficar de olho assim mesmo.

Monica G Gomes disse...

Fiquei muito confusa pesquisando na net sobre feridas que nao cicatrizam. Acabei por chegar no seu blog (parabéns, aliás).
Em uma fugida que durou 1 mes de afastamento, meu gato se machucou embaixo do braço. Essa ferida de tamanho considerável necrozou e, segundo o vet que o atendeu, só não infeccionou porque criou larvas. Quando o encontrei estava pele e ossos e gravemente machucado. Daquele dia até hoje ja completou 2 anos e essa ferida, apesar de diminuir de tamanho, não cicatriza por completo. Já foram feitas incisões, abriu-se ainda mais para pontear, ja passei varias pomadas (a ultima foi a kollagenase) e não dá resultado. Ontem o gato parecia triste e vi que a ferida tinha aberto mais ainda, muito embora ele use o colar para nao lamber e durma toda noite dentro de casa (ele nao tem acesso à rua, fica no terraço e olhe la). Tenho medo de que tenha se tornado um CARCINOMA. Seria possível? Não consigo resultado satisfatorio em nenhum dos tratamentos realizados até então.
Help!

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